quinta-feira, 24 de março de 2011

Jeová Surfistinha: soberania de Deus, ou despotismo divino? Uma questão crucial ao relacionamento do Deus amor

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A questão da soberania como um atributo divino, na mente de muitos evangélicos, considera aspectos de um sistema monárquico medieval, no qual os elementos da suposta ‘soberania’ do Estado se confundiam com elementos de uma soberania divina. Ou seja, o Estado era visto como algo que controlava a natureza má do homem, o homem do pecado, e o controlava com espada e justiça. Uma confusão reinava entre: o que era Igreja e o que era Estado, sendo o Estado como a mão da Igreja (manus ecclesiae), o poder absoluto não podia ser questionado, não admitia ser contrariado, sob pena de suplícios e morte.

O poder absoluto nesse conceito não admitia limitação de forma alguma, pois não podia ser atingido pelas leis que ele mesmo prescrevia. Quando o poder não tem limites, o próprio conceito de abuso se torna contraditório. Assim, não há critério lógico que distinga o rei do tirano, a não ser por meio de juízos de valor. Se o poder é supremo não pode haver nada que diferencie o tirano do rei, no que se refere à amplitude do poder.

Muitas vezes a tirania da Igreja e de seus representantes era considerada aceitável, pois refletia a “soberania divina”, mas, que de fato, não passava de um conceito despótico da relação de poder, atribuída em Deus, erroneamente travestida de poder do Deus Soberano.

Destarte o poder teocrático, ou a forma teocrática de soberania, inclusive a calvinista, não diz de um Deus soberano, mas de um Deus despótico e tirano, em que o despotismo é poder absoluto concentrado nas mãos do governante, e o homem (e toda a criação) tratado como escravo, sem condições de tomar decisões, totalmente rendido e submetido a esse poder, pois a autoridade de um déspota é inquestionável e opressora.

Soberania é autoridade suprema, não dividida, que não conhece superior na ordem externa nem igual na ordem interna. Contudo, pode ser limitada, ao fixar leis, submetendo-se às mesmas. Assim, há diferença entre a soberania e o despotismo; sutil, mas real. A autoridade soberana considera a lei sobre todos, e inclusive sobre si mesma- ninguém dá as leis ou as dita ao poder soberano, provem de sua autoridade, mas ao se submeter às leis que vêm de si mesmo, limita-se por escolha própria. Já o déspota não governa com leis fixas, pois não há leis, uma vez que ele não se submete as mesmas, mas antes, governa por decretos, que não são fixos, e expressam o caráter de sua vontade tirânica submetendo a todos sem os considerar nas decisões.

Quando Deus criou, ele o fez por amor, sua essência é o próprio amor, a criação existe, o homem existe, você e eu existimos pela essência amorosa de Deus, ou seja, por aquilo que ele é. Nesse momento Deus estabeleceu regras, ele não apenas criou tudo que há soberanamente, mas soberanamente FIXOU regras, e escolheu observá-las, soberanamente. Contudo limitou sua soberania, pois respeita sua própria conduta, às próprias regras que ele mesmo criou. O déspota não as respeita, ele decreta novos acontecimentos, pois suas regras não são fixas, mas fazem parte de sua deliberada vontade.

Assim, todo o argumento que diz de um Deus sobrenano governando conforme lhe apraz, apenas satisfazendo sua vontade, sem considerar sua vontade na própria criação e autonomia da mesma, autonomia esta dada por ele, é um conceito sofistico por ignoratio elenchi, em que, um argumento que leva a uma determinada conclusão: Deus é soberano. É dirigido para provar uma conclusão diferente: DEUS É DÉSPOTA.

Ainda, há que ser estabelecida à questão da autonomia, em que esta não se confunde com soberania. A autonomia é a capacidade interna de se auto-orientar, soberania é a expressão da unidade de uma ordem, ou seja, na autonomia a vontade individual se auto-orienta em determinados conceitos, sem orientar todos os conjuntos. Na soberania todos os conjuntos estão estabelecidos. Lutero compreendia isto, quando em sua teologia afirmava:

O homem pode viver exteriormente de maneira honesta e escolher entre aquelas coisas que a razão compreende, pois todos têm entendimento e razão naturais, inatos. Não no sentido de que sejam capazes de algo no que concerne a Deus, como, por exemplo, amar e temer a Deus de coração. Somente em obras externas desta vida têm liberdade para escolher coisas boas ou más. Por obras boas entendo as de que é capaz a natureza, tais como trabalhar ou não no campo, comer, beber, visitar ou não um amigo, vestir-se ou despir-se, edificar, tomar esposa, dedicar-se a um ofício ou fazer alguma outra coisa proveitosa e boa. Tudo isso, entretanto, não é nem subsiste sem Deus; ao contrário: dele e por ele são todas as coisas. Por outro lado, pode o homem também praticar por escolha própria o mal, como, por exemplo, ajoelhar-se diante de um ídolo, cometer homicídio, etc.

O fatalismo e determinismo, oriundos de uma visão supralapsarialista, não são a verdade da soberania, pois negam a comunhão amorosa de Deus com sua criação, advogam um Deus que toca na terra e a fere, pois assim consiste sua vontade e seu decreto antes de todas as coisas, sem regras, sem nada respeitar, apenas sua vontade sádica. Por sua soberania, a vontade individual, as decisões, as catástrofes naturais, tudo está fatalmente determinado, sem necessariamente uma lei, um padrão, algo que o próprio Deus déspota respeite.

Destarte, declarações que dizem que Deus possui todo o poder para realizar sua vontade conforme aquilo que o agrade são sentenças que decretam esse fatalismo e não respeitam o próprio Deus, sua essência, aquilo que ele é: o amor.

Jesus não agiu assim, quando ao se dirigir a Soberania de Deus orou: “Pai nosso que estais nos céus, santificado seja vosso nome, venha a nós o vosso reino, seja feita vossa vontade...” (vontade= θέλημα), compreende-se à escolha, inclinação, desejo, prazer. “...Assim na terra como no céus...” Significando que o nome de Deus é santo no céu, e sua santidade compreende plenamente seu parzer, sem frutração alguma, e que isso também seja na terra, assim como é no céu. O termo grego não usa vontade como o termo βοúλεμαι, querer no sentido de decidir, deliberar, plano, propósito. Ou seja, Deus quando se relaciona em sua santidade no céu, ele o faz pelo prazer autônomo, não pelo decreto soberano, e que isso também seja na terra- um relacionamento de amor, não por uma deliberação despótica.

Assim, nenhuma catástrofe está no plano de um prazer (thelema), ou de um decreto de soberania determinista, apenas faz parte de um movimento natural, um plano fixo, sem determinismo, que respeita as leis naturais, como o próprio Deus soberano as respeita em seu boulemai.

Há um circulo de fogo no pacífico, em que há movimentos de placas tectônicas, gerando terremotos e maremotos. Ao homem foi dada autonomia, para ir e vir, construir ou não nessas áreas, o homem ignora as leis naturais, fixadas por Deus, e por assim proceder, em sua ignorância, fica sujeito aos acidentes naturais. Deus não decretou isso, e nem é sua vontade que isso aconteça, mas constitui no movimento natural, a lei natural. O homem ignora porque ele quer.

Deus é amor, e não um Jeová Surfistinha, que pega ondas no pacifico para decretar sua vontade a bel prazer de toda sua criação, determinando quem vai morrer numa catástrofe para cumprir seu decreto, e ele ser soberano nisso, e mostrar ao homem quem é que manda.

Fatalismo e determinismo são heresias que contrapõem o amor de Deus, obscurecendo a relação do próprio Deus com o homem e sua criação, ofusca a salvação, e toda a graça. Um Deus que se revela na catástrofe por soberania não é Deus e sim o próprio DEMÔNIO, que veio para matar, roubar e DESTRUIR.

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