sábado, 13 de março de 2010

A Igreja e a homossexualidade: a lição de um pastor que, de fato, pastoreia!

Vou reproduzir aqui um texto que está publicado no site A Capa, na coluna do Rev. Márcio Retamero, este texto o próprio Rev. Márcio me enviou, pelo e-mail. Fazemos parte de uma mesma lista de discussão, e eu não o conheço pessoalmente, muito embora, desejo expressar o quanto fico honrado pela presença nobre que ele, por lá, nos concede. Admiro o trabalho deste homem, e de sua Igreja, que na verdade é um orgulho para mim! Sempre quando sou procurado por algum jornalista, querendo entrevistas e me pergunta: “você conhece alguma igreja que aceita homossexual?” Dou a resposta estufando o peito: “A Igreja Bethel do RJ, do Rev. Márcio.

Eles primam pela Reforma, e a igreja lá é de tradição reformada, o querido Márcio (se assim me permitem) foi pontual nesse texto, muito feliz mesmo, diria brilhante! Querido pastor, que Deus continue te iluminando, e que cada dia mais essa referência do amor de Cristo esteja no seu coração, com suas ovelhas, em todo seu trabalho, iluminando o mundo, anunciando o Reino de Deus e sua justiça!

Amor de mãe
Por Márcio Retamero* 12/3/2010 - 13:39

"Assim diz a Bíblia" ("For the Bible tells me so") é um documentário estadunidense sobre cinco famílias cristãs que enfrentaram corajosamente o fundamentalismo religioso após a descoberta da homossexualidade de seus filhos e filhas. O filme mostra contundentes análises de teólogos e pastores que desconstroem os falaciosos argumentos do fundamentalismo religioso.

Assistindo "Assim diz a Bíblia" percebemos que é possível em nossa geração o que um dos profetas bíblicos definiu como sua missão: "converter os corações dos pais aos seus filhos e dos seus filhos aos seus pais". Muitas são as famílias destruídas pelo discurso dos evangélicos e católicos fundamentalistas! Neste exato momento que você lê essas linhas, pode ter certeza que em algum lugar deste planeta um  homossexual está sendo expulso de casa porque seus pais aprenderam na igreja com o pastor ou padre que "homossexualismo" (sic) é abominação para Deus e que "são dignos de morte os que tais coisas praticam" (Romanos 1.32). Como não têm coragem de matarem os próprios filhos e filhas literalmente, matam em seus corações, expulsando-os do lar.

Um dos depoimentos mais emocionante e também chocante do filme é o de Mary Lou Wallner (foto ao lado), da cidade de Cabot/Arkansas. Mary Lou é a mãe de Anna, uma linda americana de olhos azuis, que aos dez meses de idade já balbuciava o hino cristão, que diz: "Yes, Jesus loves me! This I know, for the Bible tells me so" (Sim, Jesus me ama! Isso eu sei, porque assim diz a Bíblia).

Anna escreveu uma carta à sua mãe que contava que ela era diferente das demais meninas da universidade onde estudava, pois amava meninas e não meninos. Na carta ela escreveu sobre a angústia que sentia desde que se descobriu diferente das demais meninas, pedia à mãe compreensão, afeto, amor enfim.

Mary Lou respondeu por escrito que a amava, mas que odiava a homossexualidade de Anna, porque a Bíblia diz que homossexualidade é uma abominação para Deus. Recheou sua carta com versículos bíblicos tirados do seu contexto (como o acima citado) para que a filha não tivesse dúvidas que, para Deus, o que ela sentia era algo abominável. Anna não segurou a dor da rejeição de sua mãe, afinal, ser lésbica era parte dela, era ela, e tirou sua própria vida, pendurando-se no seu quarto.

Devastada pelo suicídio de Anna, Mary Lou conheceu a teologia inclusiva. Conheceu outras famílias cristãs que passaram pelo que ela estava passando e com eles estudou profundamente as Escrituras. A descoberta da verdade acerca do que realmente diz a Bíblia sobre a homossexualidade e a revelação de um Deus de Amor, conforme proclamado por Jesus não jogou a pá de cal sobre Mary Lou. Antes, a levantou do monturo existencial sobre o qual jazia para a militância por uma igreja inclusiva de fato e pelos direitos dos LGBTs em seu país, tornando-a uma das mais aguerridas militantes pela causa LGBT, enfrentando frente a frente as mentiras dos fundamentalistas religiosos e tombando-os com a verdade agora descoberta.

Escrevo essa coluna há dez meses. De maio de 2009 até o presente momento, tenho recebido inúmeras boas surpresas na vida, uma delas, é que há um mês multiplicam-se os e-mails em minha caixa postal de mães de LGBTs que me leem aqui no A Capa. Sim, muitas mães brasileiras estão me escrevendo pedindo auxílio para compreenderem a sexualidade de seus filhos e filhas; são mães cristãs (pais também, mas em menor número). Este artigo é a resposta pública que dou a uma delas, na verdade, a minha tréplica.

Duas semanas atrás recebi um e-mail de uma mãe de São Paulo, integrante de uma importante e conhecida Igreja Batista desta capital. Ela é mãe de três filhos e um deles, o do meio, é gay. Esta mãe e seu esposo estavam passando por uma imensa crise há cerca de um ano, desde que seu filho foi excluído do rol de membros de sua igreja, não antes de ter sido exposto diante de inúmeras pessoas de sua congregação. O resultado do que ela chamou de "calvário" foi ver seu filho profundamente deprimido, um jovem que antes era cheio de força, vigor e saúde mental, entregue aos remédios receitados por um especialista. Além disso, seu esposo jamais retornou à igreja e seus outros filhos, se recusavam também. Ela era a única que persistia em voltar à igreja "de cabeça erguida", pois até aquele momento, "sentia" que o certo tinha sido feito: seu filho é uma abominação para Deus e estava sofrendo as conseqüências do seu "pecado". 

O que esta mãe não entendia era porque, se o certo tinha sido feito, sua família que antes era uma família saudável e feliz, estava partida, sofrendo profundamente; e me perguntava: "aprendi na minha igreja que Deus ama o pecador, mas odeia o pecado. Quero saber de você que escreve neste site gay que Deus ama os homossexuais, de onde você tira essa certeza. Preciso saber disso com urgência, pois minha família está em crise e temo perdê-la".

Em minha resposta, enviei em anexo um estudo sobre Bíblia e Homossexualidade; pedi que ela lesse com atenção toda a apostila, mas não sozinha, que fizesse isso junto aos filhos e seu esposo. Também indiquei o documentário "Assim diz a Bíblia", reforçando que ela não deveria vê-lo sozinha, mas com a família reunida; que anotasse todas as suas dúvidas e que me escrevesse novamente.

Recebi sua resposta no dia 08 de março, Dia Internacional da Mulher e meu aniversário. Foi o melhor presente que recebi neste ano! Agora, assinava ela e seu esposo e eu pude sentir a emoção e o amor deles naquele e-mail. Neste, eles agradeciam muito os textos e a indicação dos filmes e que não tinham dúvidas alguma, pois o que leram e assistiram foi cura para tudo o que estavam passando até ali. Escreveram: "a missão de um profeta é também converter os corações dos pais aos filhos e vice-versa e isto foi o que seu trabalho profético fez aqui em nosso lar. Deus o abençoe!" Pediam indicação de uma igreja inclusiva e prometeram reunir a família para, no próximo domingo, estarem lá juntos, como fizeram tantas vezes no passado.

Vocês, mães queridas, que neste momento estão lendo este artigo, não precisam passar a dor que Mary Lou Wallner passou; nem precisam passar pelo "calvário" que esta mãe de São Paulo passou para se converterem aos seus filhos e filhas LGBTs. Deus é Amor e tudo o que não promove o amor, mas causa divisão, dor, sofrimento, suicídio, morte, trevas, doenças e separação não pode vir de Deus, nem de pessoas de Deus. A religião que escolhe o fundamentalismo como via tem as mãos sujas do sangue de Anna Wallner e de milhões de gays e lésbicas, travestis e transexuais que tombam, diariamente, sem vida ao chão.

A cura para o veneno que fundamentalismo religioso e o mau uso da Bíblia inoculou em nós, encontramos no amor em primeiro lugar - amor incondicional; e no conhecimento acumulado por pessoas que estudam temas como a Bíblia e a homossexualidade, dentre outros tantos temas que perpassam o assunto. Estudem! Leia tudo o que for necessário para compreenderem que homossexualidade não é pecado nem doença e se afastem daqueles que estão destruindo famílias em nome de um deus que não sabe o que é amor.

Derrubar muros e construir esperanças é o alvo de todo teólogo inclusivo e de toda igreja inclusiva. Continuem me escrevendo! Deus abençoe vocês!


* Márcio Retamero, 36 anos, é teólogo e historiador, mestre em História Moderna pela UFF/Niterói, RJ. É pastor da Comunidade Betel do Rio de Janeiro - uma Igreja Protestante Reformada e Inclusiva -, desde o ano de 2006. É, também, militante pela inclusão LGBT na Igreja Cristã e pelos Direitos Humanos. Conferencista sobre Teologia, Reforma Protestante, Inquisição, Igreja Inclusiva e Homofobia Cristã. Seu e-mail é: revretamero@betelrj.com.

Um comentário:

  1. Muito bom esse texto tbm...
    Engraçado é que num blog onde o tema principal é homossexualismo e religião os textos mais específicos não tem comentários enquanto que os textos que se referem a atualidades não tão importantes tem. Não estou criticando você, muito pelo contrário. Parabéns por difundir essa idéia... Eu não sou homosexual mas torço para que todos sejam tratados igualmente e que ninguém se sinta pecador por ser quem é.

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