domingo, 2 de novembro de 2008

Nota da ABGLT sobre a exclusão de homossexuais do sacerdócio católico

A Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), entidade de abrangência nacional que congrega 203 organizações congêneres, e cuja missão é promover a cidadania e defender os direitos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, contribuindo para a construção de uma democracia sem quaisquer formas de discriminação, afirmando a livre orientação sexual e identidades de gênero, vem a público expressar indignação diante da atitude discriminatória do Vaticano em avaliar candidatos ao sacerdote por meio de exame psicológico, com rejeição daqueles que tal análise considerar serem homossexuais.

A ABLGT lamenta que, no ano em que a Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 60 anos, o Vaticano possa adotar uma prática flagrante de discriminação desta natureza. Citamos: “Artigo I: Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade. Artigo II: Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.”

Em dezembro de 2007, o Arcebispo italiano Silvano Tomassi, representando o Vaticano em sessão do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, afirmou que os direitos básicos de cada ser humano “não estão sujeitos aos altos e baixos históricos ou interpretações de conveniências” e que a dignidade humana “transcende qualquer diferença religiosa, política ou cultural”, unindo todas as pessoas “numa única família”.

(Fonte: teologia fé e vida)

Ora, há uma nítida contradição no discurso do Vaticano, que por um lado prega o respeito aos direitos humanos e afirma que todas as pessoas fazem parte de “uma única família”, ao mesmo tempo em que exclui os homossexuais de seus quadros. Materializou-se a situação prevista por George Orwell, em sua sátira A Revolução dos Bichos: “todos os animais são iguais, mais alguns são mais iguais do que outros”.

A competência, ou “rigidez de caráter”, de um sacerdote independe de sua orientação sexual, assim como a prática da pedofilia não é exclusiva aos homossexuais. Estudos demonstram que a pedofilia é praticada contra crianças de ambos os sexos, majoritariamente por homens heterossexuais, muitas vezes o pai ou parente próximo da vítima. É improvável que a medida tomada pelo Vaticano resulte na almejada diminuição dos casos de pedofilia praticados por seus sacerdotes. A ABGLT condena a pedofilia e, conforme disposições de seu estatuto e as resoluções do seu I Congresso, não aceita a afiliação de organizações que promovem a pedofilia.

Para a ABGLT, a atitude do Vaticano não é atitude cristã, é uma atitude discriminatória, ou seja, anti-cristã. Trata-se de martirizar pessoas que apresentam essa diferença em relação à maioria, demonizando-as. Trata-se de manter a discriminação, aquela que a Igreja diz combater.

A ABGLT já solicitou ao Conselho Federal de Psicologia que se pronuncie sobre esse acinte à cidadania da comunidade de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, tendo em vista que em 1999 o Conselho publicou a Resolução 001/99 que diz que “a homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão” e que “os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas”. O Conselho deverá se pronunciar dentro de uma semana.

Na semana que vem, será realizada a XXIV Conferência Mundial da Associação Internacional de Lésbicas e Gays (ILGA), em Viena, Áustria. O evento reunirá delegados de organizações LGBT do mundo inteiro e a delegação brasileira solicitará a emissão de uma nota de repúdio ao Vaticano em nome da comunidade internacional LGBT.



Toni Reis

Presidente da ABGLT

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